terça-feira, dezembro 23, 2025

O CASO HAVAIANAS X BOZOLÓIDES RAIVOSOS E ALOPRADOS

 

Análise: A Algoritmização da Barbárie e o Caso Havaianas

O episódio envolvendo a campanha da Havaianas com Fernanda Torres transcende uma simples disputa comercial; ele é um sintoma pedagógico de um fenômeno sociotécnico contemporâneo. Podemos classificar essa atitude e conectá-la ao conceito de Algoritmização da Barbárie através de três eixos fundamentais:

1. Classificação da Atitude: O "Pânico Moral Estratégico"

A reação de lideranças de extrema-direita não é meramente orgânica, mas sim uma forma de Pânico Moral Estratégico.

  • Distorção Semântica: A expressão "pé direito" é um idiomatismo secular. A transformação de um voto de sorte em uma "indireta política" demonstra uma vigilância semiótica exaustiva, onde qualquer signo (cores, gestos ou palavras) é sequestrado para alimentar o binarismo "nós contra eles".
  • Sinalização de Virtude Negativa: O ato de descartar o produto e postar nas redes sociais serve como um rito de passagem digital. O objetivo não é apenas prejudicar a marca, mas reafirmar a identidade do grupo através da exclusão e do ataque a um símbolo cultural (Fernanda Torres).

2. A Algoritmização da Barbárie

O conceito de Algoritmização da Barbárie refere-se ao modo como as redes sociais priorizam o conflito e a desumanização em busca de engajamento. No caso em tela, isso se manifesta da seguinte forma:

A Economia do Conflito

Os algoritmos das plataformas (X, Instagram, TikTok) são programados para maximizar o tempo de tela. Conteúdos que geram indignação e raiva têm taxas de distribuição exponencialmente maiores do que conteúdos neutros. A "barbárie" (o ataque, o boicote, o ódio) torna-se o produto mais rentável para a plataforma.

O "Efeito Manada" Automatizado

Uma vez que uma liderança dispara o gatilho do boicote, os algoritmos criam uma câmara de eco. O usuário que consome conteúdo de direita passa a ser inundado apenas por vídeos de pessoas jogando sandálias fora, criando a ilusão de que existe uma unanimidade moral sobre aquele "erro" da marca, o que acelera o comportamento de manada.

A Descontextualização como Método

A algoritmização exige fragmentos curtos. Um vídeo de 15 segundos ignorando o contexto de uma campanha de fim de ano é perfeito para a viralização. A complexidade (a metáfora da sorte) é sacrificada em favor da eficácia do ataque.

3. Impacto Econômico: O "Terrorismo de Mercado"

A queda de R$ 200 milhões no valor de mercado da Alpargatas revela a eficácia dessa estratégia no capitalismo de vigilância:

  • Insegurança Corporativa: O mercado reage ao ruído digital, não necessariamente à lógica. A queda nas ações é um reflexo do medo de que a "máquina de cancelamento" afete o consumo real, mesmo que a polêmica seja artificialmente inflada.
  • O "Chilling Effect" (Efeito Inibidor): O objetivo final da extrema-direita, ao usar a força do algoritmo para punir uma marca, é intimidar outras empresas. Isso cria um ambiente onde o setor privado passa a evitar artistas ou temas que possam ser "polemizados", gerando uma censura velada pelo mercado.

Conclusão

Estamos diante de uma simbiose entre ideologia e código. A barbárie não é apenas a falta de civilidade, mas uma tática política que encontrou no design das redes sociais a ferramenta perfeita para a fragmentação social. O caso da Havaianas prova que, na era da algoritmização, a verdade da mensagem importa menos que a sua capacidade de ser convertida em um projétil digital contra o adversário.

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