A meritocracia, em sua essência, propõe que o sucesso individual deve ser determinado unicamente pelo mérito e esforço. Contudo, quando confrontada com a realidade da justiça social, essa ideia revela suas profundas contradições e, muitas vezes, seu caráter antagônico.
A premissa da meritocracia de que todos partem de um mesmo ponto de partida ou têm as mesmas oportunidades é uma ilusão perigosa. Ela ignora as desigualdades estruturais e históricas que moldam a vida das pessoas: a qualidade da educação, o acesso à saúde, a segurança, a herança cultural e econômica, e a própria cor da pele ou gênero. Em um campo de jogo tão desnivelado, exaltar o "mérito" individual sem antes nivelar as condições é perpetuar privilégios e legitimar a exclusão.
A justiça social, por outro lado, busca precisamente corrigir essas distorções. Ela não se contenta em premiar o esforço em um sistema injusto; ela exige que as oportunidades sejam equitativas e que as barreiras sistêmicas sejam removidas. O objetivo é garantir que todos, independentemente de seu ponto de partida, tenham as condições mínimas para desenvolver seu potencial.
Nesse cenário, a meritocracia pode se tornar uma ferramenta de manutenção do status quo, disfarçando a falta de oportunidades como falta de mérito. Ela desresponsabiliza o Estado e a sociedade de seu papel em criar condições básicas para todos, transferindo a culpa do insucesso para o indivíduo.
É aqui que as decisões políticas se tornam cruciais. A escolha entre políticas que reforçam a falsa narrativa meritocrática ou que investem ativamente em justiça social define o tipo de sociedade que construímos. Priorizar a justiça social significa investir em educação pública de qualidade, saúde universal, saneamento, moradia digna e políticas afirmativas que buscam reparar injustiças históricas.
Em suma, não podemos falar em meritocracia plena sem antes garantir a justiça social. Uma não justifica a outra; pelo contrário, a busca por uma verdadeira justiça social frequentemente exige que questionemos e desconstruamos a lógica meritocrática que ignora as profundas desigualdades de nosso ponto de partida. Nossas escolhas políticas devem refletir esse compromisso com a equidade, e não com a validação de um sistema intrinsecamente desigual.







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